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Terminou nesta sexta (9) o 9º Encontro Institucional da Magistratura Trabalhista da 5ª Região, promovido pela Escola Judicial do TRT5 (Ejud5), que aconteceu no auditório do Tribunal Pleno e na Sede da Escola, em Nazaré. O evento, que começou na última segunda (5) teve cinco dias de programação focada nos quatro eixos da Enamat – Eticidade, Alteridade, Resolução de Conflitos e Direito e Sociedade – e contou com a participação de aproximadamente 140 magistrados.
Nesta edição, houve palestras, conferências e debates no turno da manhã e, durante a tarde, foram realizados laboratórios sobre o tema apresentado no turno oposto. Na abertura do evento, no dia 5, a presidente do Regional, desembargadora Lourdes Linhares, destacou a programação do Encontro “tratando de questões técnicas, que tocam diretamente a atividade jurisdicional, como também de temas transversais, que ampliam o nosso repertório institucional, consequentemente impacta nas nossas decisões e no nosso trabalho de gestão”.
Mencionado ser este “o último da nossa gestão”, a presidente parabenizou a Escola Judicial pelo “cuidado, critério e dedicação na organização do evento”. Em seguida, exibiu um vídeo (clique aqui) que apresenta as principais realizações do TRT5 na atual gestão. “É um balanço da nossa gestão, baseada nos princípios da Administração Pública, da prestação de um serviço de qualidade e com eficiência, mesmo diante do cenário de escassez orçamentária e de pessoal“, explicou Linhares.
Também presente na mesa de abertura, a diretora da Escola Judicial, desembargadora Margareth Costa, falou sobre o trabalho da Escola Judicial “no cuidado com a formação dos magistrados, em especial, para que se reconheçam na integralidade daquilo que já buscam e têm por alcançar a melhor parte do eu de cada um de nós, no todo que congregamos onde fomos colocados a trabalhar e viver, conjugando justiça com harmonia e paz”. Costa concluiu o seu discurso (veja aqui o documento completo) associando os temas das palestras aos eixos da Escola Nacional e ao cotidiano dos magistrados.
No último dia do Encontro, houve a palestra A justiça sob o olhar da filosofia, ministrada pela professora de filosofia Lúcia Helena Maya, que começou a apresentação falando da representação do vocábulo justiça dentro da estrutura filosófica. Para ela, o conceito de justiça pode enriquecer a sua aplicação. Em seguida, uma homenagem aos magistrados encerrou o evento.
Confira abaixo o resumo do que foi abordado pelos palestrantes durante o Encontro.
Ética
As implicações éticas nas redes sociais para os membros do Poder Judiciário
Eduardo Bittar
 (professor USP) – “A primeira observação a ser feita é quanto à importância dos magistrados se conscientizarem quanto à atitude cuidadosa da sua inserção nos meios virtuais, mas especialmente das redes sociais, que têm a capacidade de atravessar fonteiras e conectar pessoas com muita rapidez, simplicidade e gratuidade, mas, ao mesmo tempo, podem causar encontros e desencontros comunicativos que são brutais e disruptivos, e nesse processo de brutalização e ruptura da comunicação pode estar envolvida a imagem do Poder Judiciário. Então, é importante conectar a liberdade de expressão com a responsabilidade pelo exercício do cargo, a representatividade da imagem do Judiciário e, por fim, o Código de Ética da própria classe.”
Alteridade
Relacionamentos interpessoais na jurisdição
Alysson Mascaro (professor USP) – “Pelo nosso inconsciente passam coisas como patriarcalismo, machismo, racismo, homofobia e, em especial, distinção de classe. Em muitas ocasiões nós não nos apercebemos de que as linguagens sociais, os símbolos são distintos, e é a partir daí também as opressões, as limitações do próprio convívio, que fazem com que as pessoas se sintam constrangidas em um certo tipo de relacionamento social. No Judiciário isso é mais patente ainda porque nós lidamos com o jurisdicionado e ele tem toda uma história de vida que muito raramente tem ligação com a própria estrutura e com a cultura judiciária.”
Você sabe com quem está falando?
Márcio Túlio
 (desembargador aposentado TRT3) – “Abordo a questão “Você sabe com quem está falando” sob dois aspectos. Um é o mais óbvio, tentando mostrar por que é que nós às vezes dizemos isso e o que nos faz falar assim e o que fazer em face disso. O outro aspecto é o inverso. Hoje, a sociedade como um todo, vem dizendo ao juiz: “Você sabe como quem está falando?”. Ou seja, o juiz está perdendo o poder e alguns reagem tentando ser mais autoritários do que eram. O fato de estarmos aqui discutindo essa questão já nos mostra que alguma coisa mudou. Questões como essa não seriam discutidas há um tempo, porque as pessoas aceitavam o poder do juiz sem contestação, as pessoas nem se davam conta de que aquele poder ou manifestação desse poder poderia ser desrespeitosa ou não.”
O “jeitinho brasileiro” e seus limites – legalidade e Poder Judiciário
Nanci
 (psicóloga) – “Com o olhar da psicanálise, aponto como a gente desenvolve a moralidade. Abordo também o que tá acontecendo nos últimos tempos, pois parece que há um aumento desse comportamento, desse ‘jeitinho’ e mesmo da corrupção. É preciso discutir a corrupção dentro da Administração Pública, se é um fator da nossa moralidade que está baixo, se estamos mais vulneráveis, ou se a estrutura do Estado e da sociedade que facilita que isso ocorra. Então trouxe esse olhar mais subjetivo da moralidade e do ‘jeitinho brasileiro’. Inclusive existe uma concepção um pouco ideológica, meio discriminatória de que só o brasileiro tem esse jeito. Se fala ‘jeitinho brasileiro’, mas isso não ocorre só aqui.”
Resolução de Conflitos
Racionalidade decisória – o hermetismo da linguagem e a compreensão dos leigos: a democratização do Poder Judiciário pelo seu discurso
Daniel Oitaven
 (professor Ufba) – “Trabalhamos com a linha na combinação entre a ética da justiça e a ética do cuidado. Podemos, por exemplo, ter a possibilidade de o juiz deixar a parte falar um pouco mais, especialmente no momento da conciliação, encontrar uma espécie de pista do que está por trás do conflito de verdade, não no aspecto jurídico, mas no aspecto, digamos, pré-jurídico, no aspecto moral. Porque às vezes você julga e decide de acordo com a legislação, mas as partes não ficam propriamente satisfeitas, a parte que perdeu não fica satisfeita não porque não ganhou, mas porque ela não sentiu que o que estava efetivamente em jogo foi devidamente considerado. Se o juiz entender o que estava efetivamente em jogo e, numa linguagem leiga, conseguir passar isso pra parte, tornará mais viável uma espécie de efetividade da prestação jurisdicional no que diz respeito à resolução de verdade do conflito.
Direitos Humanos em perspectiva com a Justiça do Trabalho
Antônio Rodrigues (professor USP) – Desde os anos 80 os direitos sociais de uma forma geral estão sofrendo uma crise de legitimidade. E a saída que se buscou para retomar os esforços no sentido da efetivação dos direitos sociais, trabalhistas, foi aproximá-los dos direitos humanos. Mas será que é possível aproximar direito do trabalho e direitos humanos? Eu acredito que sim, mas não é uma tarefa fácil. Basicamente porque os direitos humanos são caudatários de uma agenda voltada para proteção, em primeiro lugar do indivíduo, e atento para a tutela das minorias. E os direitos sociais e trabalhistas são produto da luta política das maiorias, do coletivo, da luta social. A grande questão é como conjugar as duas agendas sem que essa conjugação reduza o campo de abrangência do direito do trabalho. E, por outro lado, sem que o direito do trabalho deixe de aproveitar a energia emancipadora, doutrinária, ideológica e política dos direitos humanos.
Direito e Sociedade
Impacto do racismo e gênero no acesso à justiça e efetivação de direitos
Wânia Jesus de Sant’Anna
 (historiadora) – “Todas as instituições ainda têm uma resistência muito grande em considerar que as situações de conflito, às vezes etno raciais, deverão ser ponderadas também. A democracia racial poderia ter feito algo extraordinário, uma sociedade mais igualitária, mas não funcionou dessa maneira. Funcionou para subordinar e desumanizar determinados grupos em favorecimento de outros. É possível reformular o pensamento das instituições quando determinado segmento da população ingressa nele, isso é justo, é igualdade de oportunidades.”
Impactos da tecnologia no mundo do trabalho
Márcio Pochmann 
(professor Unicamp) – É uma reflexão sobre a relação das transformações tecnológicas e suas condicionalidades sobre o trabalho com uma abordagem mais histórica e buscando fazer um diálogo com as vertentes de interpretação da atual situação de progresso tecnológico e próprio emprego. Esse momento, dentro dos últimos 30 anos, de transformação tecnológica, tem rebatido mais sobre o trabalho chamado imaterial, que é aquele que não produz algo tangível, o trabalho geralmente no setor de serviços. Então se tem uma heterogeneidade de atividades que tem a ver, em grande medida, com o aparecimento do trabalho em plataformas, aplicativos. Esse tipo de trabalho, ao contrário do que se tem dito, que é uma economia, que a tecnologia vem substituindo mão de obra, na verdade vem ampliando os postos de trabalhos. Tanto assim que nos países mais avançados tecnologicamente, Estados Unidos, Alemanha e mesmo a China, não têm problemas de desemprego praticamente, é quase situação de pleno emprego, com desemprego abaixo de 3% da força de trabalho. Todavia, tem outros tipos de problemas, como qualidade do emprego, remuneração, estabilidade, segurança, intensificação do trabalho, jornadas extensas etc.
Sustentabilidade
Ketlin Feitosa (assessora-chefe STJ) – “O papel da Justiça do Trabalho dentro do conceito é enorme, porque trabalha justamente com pessoas, com direitos humanos e, muitas vezes, ficamos atrelados aos processos e esquecemos que são pessoas. Então o discurso tem que combinar com a prática. Valorizar o servidor, ter uma estrutura adequada para receber a sociedade, com rampas, elevador acessível, observando as normas da ABNT. Às vezes são coisas muitos simples e que podem traduzir num bom atendimento, num reflexo positivo na Ouvidoria, em construções participativas e democráticas. O planeta é um só, dentro dele estão os recursos naturais, as pessoas, as instituições. Quando a gente fala de sustentabilidade a gente tem que ter um olhar sistêmico e transversal. Olha para o próximo e você vai tá falando de sustentabilidade.”
As decisões judiciárias e o relacionamento do juiz com a mídia
Patrícia Resende
 (jornalista TST) – Discutir a comunicação, como as instituições se comunicam, seus integrantes, que são seus porta-vozes, é bastante importante. Já há alguns anos são feitos cursos para preparar os magistrados para esse relacionamento com a mídia, preparar os administradores de Tribunais, para gerenciar a comunicação, porque o nosso objetivo maior é sempre fortalecer a imagem institucional da Justiça do Trabalho. E no mundo conectado que a gente tá hoje essa percepção é ainda maior. E precisamos, em meio a tantas narrativas, estar preparados para se posicionar perante a opinião pública, por isso esse preparo é tão importante.
Emiliano José (jornalista) – “Os juízes do trabalho e a Justiça do Trabalho como um todo há que tomar muito cuidado na relação com a mídia, na relação com imprensa e tomar o cuidado com a palavra, dizer aquilo que cabe dizer, e o que não couber, não dizer. Aos juízes cabe muita prudência, recato, ao contrário do que muitos juízes nesta quadra recente acreditaram, que podiam valer-se do espetáculo para justificar sentenças obscuras e programáticas como evidenciado está agora, sobretudo pelo trabalho do Intercept.”
Justiça
A justiça sob o olhar da filosofia
Lúcia Helena Galvão Maya
 (professora de filosofia) – “A jornada do conhecimento e do crescimento nunca deve cessar. É importante conhecer a abordagem da Justiça por um outro ângulo e enfrentar o preconceito que paira sobre a filosofia em nosso momento histórico. O conceito filosófico de justiça, a necessidade de um sentido de vida humano e da vivência consciente de valores e o necessário combate ao egoísmo são pontos de destaque da palestra”.
Fonte: Ejud5