Foram abordados assuntos como o compromisso com a eficiência, os direitos e os deveres, o consentimento dos empregados, os princípios norteadores e o respeito à privacidade.

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e suas aplicações práticas e teóricas na Justiça do Trabalho foram tema das palestras ministradas nesta sexta-feira (19), no segundo e último dia do Curso de Formação Continuada (CFC) promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat). Foram abordados assuntos como o compromisso com a eficiência, os direitos e os deveres, o consentimento dos empregados, os princípios norteadores e o respeito à privacidade.

Compromisso com eficiência 

Abordando os aspectos da Lei de Acesso à Informação (LAI), os vetores de transparência e eficiência da LGPD e as devidas implicações práticas, o juiz de Direito do Tribunal de Justiça de São Paulo Fernando Antônio Tasso fez um paralelo entre as duas leis e ressaltou que sua observância qualifica a atividade jurisdicional, prestigiando os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da ética, da publicidade e da eficiência. 

“As normas têm aplicação prática e imediata e permeiam os atos mais triviais da nossa rotina”, afirmou. “Quando a alta administração patrocina uma política de proteção de dados que se torna um engajamento de magistrados e servidores, essa política pública é mais do que um dever. Ela se torna um compromisso com a eficiência, pois somos somente pessoas cuidando de pessoas”.

Direitos e deveres 

O advogado e especialista em compliance Giordano Adjuto apresentou uma metodologia prática de aplicação da LGPD às questões ligadas à privacidade de proteção de dados, na esfera trabalhista, para auxiliar os magistrados a entenderem como funciona um programa de compliance. “Precisamos conscientizar as organizações de quais são os direitos e deveres no que diz respeito ao tratamento de dados, pois é fundamental proteger a liberdade e a privacidade do cidadão”, assinalou.

Nesse sentido, o especialista ressaltou a importância da recente  edição do Ato Conjunto TST.CSJT GP 4/2021, que instituiu a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. “Tenho certeza que essa norma vai nos  impactar diretamente no relacionamento com esses órgãos e será uma referência para os demais tribunais estabelecerem as suas políticas”.

Princípios 

No painel “A Implantação da LGPD na Justiça do Trabalho”, o juiz do trabalho da 3ª Região (MG) Iuri Pinheiro fez uma exposição sobre os dez princípios para o tratamento de dados segundo a lei, como o da finalidade, da necessidade e da  segurança. “O ato de um juiz permitir o acesso a documentos com dados de partes no processo não é nenhuma prática ilegal”, disse.

Segundo ele, a lei prevê que, para o exercício regular de direito em processos judiciais, é possível o tratamento de dados. “Isso se constitui em uma obrigação legal de todo e qualquer magistrado que deve, necessariamente, prestar a jurisdição”, esclarece.

Respeito à privacidade

O advogado e professor Raphael Miziara abordou o respeito à privacidade e aos dados pessoais sensíveis na LGPD. Para exemplificar, contou casos reais de empresas que fazem uso de grandes volumes de dados para fins diversos, como conteúdo político e vantagem sobre a concorrência. “Hoje, todas as grandes empresas utilizam decisões automatizadas, por algoritmos, para a contratação de empregados, inclusive para direcionar anúncios de emprego, o que pode possibilitar discriminações, seja por um viés de raça, sexo ou classe social”, relatou. 

O especialista destacou que a LGPD se baseia em três princípios – finalidade, necessidade e não-discriminação – e destacou o papel do consentimento na legislação. “A doutrina européia fala que não existe manifestação realmente livre em uma relação jurídica marcada pela desigualdade de poder, como as relações de trabalho. Como pensar, então, o consentimento do empregado em relação a seus dados?”, refletiu. Miziara concluiu defendendo a importância da autonomia do encarregado pela proteção dos dados, figura criada pela LGPD.

Responsabilidade

No último painel do dia, a desembargadora aposentada do TRT da 1ªRegião (RJ) Vólia Bomfim discorreu sobre o dever do empregador de informar ao empregado as responsabilidades na condição de operador, controlador e encarregado e as penalidades contratuais trabalhistas decorrentes da LGPD. “A problemática de entender se o operador pode ser empregado é a questão da subordinação e da responsabilidade solidária. Como um empregado que tem que respeitar as ordens do patrão deve ser solidário em caso de vazamentos de terceiros?”, questionou.

A magistrada ainda falou sobre a figura do consentimento na fase contratual e pré-contratual e como esse aspecto se aplica a elementos práticos, como ficha de registro e eSocial, biometria, filiação sindical, monitoramento de e-mail funcional, pesquisa de passado funcional ou social, painel de cartões de ponto e crachá. 

Concluiu explicando que há diversas correntes sobre a responsabilidade civil na LGPD – subjetiva, subjetiva com presunção de culpa, subjetiva com possibilidade de excepcionalmente se admitir a culpa objetiva e até integralmente objetiva. “Há empresas que têm milhares de empregados e tratam dados massivos, com um tráfego enorme de informações. Nesses casos, há um risco maior, de modo que surge a interpretação de responsabilidade objetiva em caso de dano a terceiros”, concluiu.

(AM/VC/CF)