Aprender a ouvir os outros e saber perguntar. A fórmula parece simples, mas exige treino, planejamento, respeito pelas pessoas e, como diz o juiz do trabalho Ricardo Córdova Diniz, “trabalhar muito com a percepção” quando se trata de ouvir partes e testemunhas em audiência, na fase de instrução processual. O magistrado enfatizou que se deve romper com a ideia de verdade real e, em vez disso, buscar “a ideia de máxima probabilidade de verdade”.

Ricardo Diniz apresentou o tema “Técnica da Instrução Processual”, na tarde de sexta-feira (24), para os alunos juízes do 23º Curso de Formação Inicial (CFI) da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat). Incluídos no programa estavam três pontos: “O juiz do trabalho e a prática das audiências (postura, poderes, deveres e incidentes processuais)”, “O juiz do trabalho e a prova – da produção à apreciação” e, por último, a “Técnica de coleta da prova oral”.

Titular da 3ª Vara do Trabalho de Itajaí (SC), do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-SC), com 24 anos de experiência em audiências na Justiça do Trabalho, mestre em Ciência Jurídica e professor universitário, Diniz falou que as faculdades brasileiras não preparam os profissionais para a instrução processual. “Escreve-se muito pouco a respeito do assunto no Brasil, principalmente naquilo que diz respeito à abordagem das partes e testemunhas. Não temos técnicas desenvolvidas”, assinalou.

O magistrado destacou a necessidade de se estudar, pesquisar, sistematizar, compartilhar e definir quais técnicas, ou seja, “construir as técnicas que efetivamente funcionam para disponibilizar como uma ferramenta para o juiz utilizar na instrução processual”. Por isso, para ele, a Enamat tem um grande papel. “Aqui estamos produzindo isso,”, ressaltou.

Técnica do Fato Circunstancial

Segundo Diniz, a troca de experiências organizacionais é de suma importância. “É a partir dessas experiências que se constrói e aprimora nosso conhecimento”, afirmou. Com esse objetivo, ele propôs na aula que, ao tomar os depoimentos em audiência, os juízes utilizem a “Técnica do Fato Circunstancial”, que consiste em fazer as mesmas perguntas para todas as partes e testemunhas acerca de fatos circunstanciais, aqueles que levam à compreensão do fato principal.

Na avaliação de Ricardo Diniz, é mais difícil interpretar os fatos do que as leis, e nem sempre as pessoas que dão versões diferentes do mesmo fato estão mentindo: elas podem apenas ter tido percepções diferentes, e cabe ao juiz aguçar sua percepção para conseguir “juntar os tijolinhos”, usando raciocínio lógico e probabilidades.

Diniz instrui que, no processo investigatório, o juiz, ao utilizar a técnica do fato circunstancial, vai buscar, além da reconstrução do contexto fático, justificativas razoáveis para o fato principal e identificar contradições e semelhanças entre os depoimentos, a fim de conferir com maior segurança, a cada um deles, o valor que julgar adequado. Ele considera essencial o planejamento da audiência, trabalho de preparação que define o que deve ser feito, como deve ser feito e quem deverá fazer. Nessa preparação, é importante que o magistrado se contextualize, reunindo informações tais como os limites da lide, os pontos controvertidos, as provas já produzidas, manifestações sobre essas provas, necessidade de outras medidas (perícias, por exemplo) e a estratégia de abordagem das partes e testemunhas.

Produção da prova oral

Na instrução processual, o ato de ouvir partes e testemunhas ocupa o maior tempo do juiz. Por isso, para Diniz, a obtenção de um bom resultado na produção da prova oral depende em grande parte do modo como se interroga a testemunha. Saber perguntar, então, é a grande dica. Não se trata apenas do que perguntar, mas como, quando, porque e a quem perguntar.

Com muitos exemplos e dando explicações da técnica que aplica ao dirigir as audiências, Ricardo Córdova ressaltou que é importante ser muito educado, respeitador, ter senso de humor, não se envolver emocionalmente (entrar em discussão com as partes e testemunhas), ir além das palavras proferidas pelas pessoas e observar a linguagem não verbal. Deve-se ainda manter contato visual com o depoente, procurar uma distância ideal (cerca de um metro) e evitar barreiras físicas e que o depoente tenha contato visual com outras pessoas. Lembrou por fim que se deve testar vários métodos e que, em alguns casos, a técnica de separação das partes pode ter bons resultados.

(Lourdes Tavares/CF)