Em aula ministrada hoje (30) pela manhã à turma do 8º Curso de Formação Inicial da Escola Nacional da Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat), o juiz do Trabalho aposentado Márcio Túlio Viana tratou de um assunto que passa ao largo das formalidades processuais: a psicologia da prova testemunhal, ou, na sua definição, “as coisas pouco visíveis que habitam o processo”. O tema é particularmente relevante na Justiça do Trabalho, devido a sua característica oralidade e no qual, muitas vezes, a sentença se alicerça basicamente nos depoimentos colhidos das testemunhas e das partes.

“A prova oral é comum na Justiça do Trabalho, talvez mais do que em outros ramos, porque o contrato de trabalho tem vários aspectos tácitos”, observa o magistrado. Por isso, várias “batalhas silenciosas” se travam numa sala de audiência, como o advogado que “trabalha” uma testemunha e o juiz que tenta desconstruir este trabalho. “Para além dos pedidos dos autos existem outros não escritos, muitas vezes mais importantes: a reparação de humilhações, a necessidade de vingança, a afirmação da cidadania, a prova de coragem.”

Márcio Túlio citou autores que afirmam que a participação da palavra na construção do significado é de apenas 7%. O modo de voz participa com 38%, e outros 55% cabem aos gestos e à expressão corporal. Parte do trabalho do juiz, portanto, é ir além das palavras e perceber, em outros níveis, o que realmente está dizendo cada testemunha – ou mesmo ver além do que está sendo dito e chegar ao não-dito. As partes (especialmente os trabalhadores) também sofrem diversas influências – entre elas a do próprio aparato judiciário. “A bandeira, o estrado mais alto onde se senta o juiz, o soldado na porta, as vestes, as falas rituais, tudo isso influi na prova e, consequentemente, na sentença, relativizando o ideal de racionalidade do processo”, explicou.

Para os jovens magistrados, a grande lição do veterano é que desenvolvam a sensibilidade para os “assuntos da vida”. “O juiz tem de se enriquecer de coisas fora do Direito para aplicar bem o Direito”, concluiu.

(Carmem Feijó/Enamat)

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