Evento foi aberto oficialmente pela presidente do TRT8 e discutiu temas polêmicos do mundo do trabalho no século XXI.

Ministro Augusto César Leite de Carvalho

O ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Augusto César Leite de Carvalho, fez a conferência de abertura do 1º Simpósio Internacional EJUD8, que tem como tema “Mundo do Trabalho no Século XXI: Desafios e Perspectivas”. A apresentação do ministro foi feita pela presidente do TRT8, desembargadora Graziela Leite Colares, que destacou o currículo do ministro e a sua extensa contribuição acadêmica com passagens por diversas instituições de ensino no Brasil e no exterior.

O ministro, que tem pós-doutorado em Direitos Humanos pela Universidad de Salamanca, na Espanha, onde leciona, e palestrante renomado no campo do direito social em diversos eventos internacionais falou sobre “Trabalho e dignidade humana no século XXI”.

Antes de expor o tema, Leite de Carvalho lembrou a partida precoce do ministro Walmir Oliveira da Costa, aos 63 anos, ” um paraense com quem convivi, que dignificou a magistratura trabalhista e nos deixou na quarta-feira da semana passada fazendo-nos saudosos da sua companhia, de sua inteligencia, de sua amizade. Quero desejar em oblação que o céu receba nosso valoroso colega Walmir Oliveira da Costa”.

Na abertura do evento, o diretor da EJUD8, desembargador Walter Paro, também fez referência às vítimas da Covid-19 e pediu um momento de silêncio em memória do ministro Walmir Oliveira da Costa e ao juiz Dennis Jenning, da Vara do Trabalho de Itaituba, no Pará, que morreram em decorrência de complicações da doença. “Nesta efêmera passagem cada um deixa a sua contribuição, sua marca e também deixa saudades”, disse o desembargador destacando que ambos eram “magistrados e colegas de estreito convívio que deixaram, além da dor da saudade, seus inestimáveis legados para que no futuro tenhamos um mundo do trabalho melhor”.

Ao falar dos direitos inerentes ao trabalho, o ministro afirmou que o direito deve promover progressivamente a igualdade material a que todo ser humano tem direito. “Nós somos iguais em dignidade e a dignidade nos quer iguais”. E destacou como a pandemia do novo coronavírus ameaça a atividade econômica e é disruptiva porque “aguça a alteridade, a empatia, aquilo que nós podemos chamar de mimetismo social, ela nos faz ver o outro como uma extensão de nós. Tem dito Boaventura de Sousa Santos que a pandemia nos faz mais titulares de deveres do que de direitos. Pensemos em vacina, pensemos em tratamento hospitalar. Do modo mais perverso, a pandemia nos ensina que a saúde, se é assegurada só há alguns , ela importa a doença de todos. Que a educação, a formação moral e acadêmica, se a educação é dada apenas há alguns poucos faz a esses poucos contaminados pela ignorância de todos os demais”.

Ao final, parafraseou Cazuza: “os não educados estão morrendo de overdose e os maus educados tomaram o poder”

Leite de Carvalho também ressaltou a crise social, econômica, sanitária e também política que atribui aos trabalhadores brasileiros parcela de responsabilidade. “Os trabalhadores brasileiros são despossuídos e ao mesmo tempo repletos de desejos igualmente emancipatórios e a responsabilidade, todos nós sabemos, pressupõe ato culposo e relação de causalidade”.

Deixou perguntas para reflexões. “Nós temos uma atribuição maiúscula nessa crise. Se é verdade que o emprego que sobra após a automação, após a digitalização de quase toda a economia, se é verdade que esse emprego que sobra é mais rentável se é precário ? Será nosso papel de substituir essa crise econômica por uma crise de direito ? Nós do poder judiciário aceitaremos resignadamente essa função social de desacreditarmos e descredenciarmos a dignidade da pessoa humana como célula mater do desenvolvimento humano, desenvolvimento sustentável? Não haveria ativismo judicial em incesto ao desprezo desse princípio que reclama hegemonia em toda a ordem jurídica?”

E, encerrou a conferência lendo o artigo primeiro da Declaração Universal dos Direitos Humanos. “Todos os seres humanos nascem iguais em dignidade e direitos”.

Painéis

Durante a manhã, os painelistas trataram de temas envolvendo as relações de trabalho no painel “Relações de trabalho: novas configurações e velhos desafios”. A desembargadora do trabalho do TRT1 e Professora Doutora da UFRJ, Sayonara Grillo Coutinho Leonardo, falou sobre “Trabalho decente e gig economy: desafios e pressupostos” e refletiu sobre o novo modelo de organização da produção no sistema capitalista e as novas empresas surgidas no contexto do chamado capitalismo de plataforma, que universaliza formas de precarização do trabalho, com a retirada de direitos.

Outras perspectivas teóricas sobre esse assunto foram abordados pelo Prof. Dr. Fernando Fita Ortega , da Universidade de Valência, na Espanha, que tratou sobre “Novas morfologias do trabalho”. O advogado e Prof. Dr. da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Antonio Carlos Aguiar, apresentou “Os desafios da subordinação algorítmica”.

O Prof. Dr. André Zipperer abordou um dos temas mais polêmicos da manhã, “Intermediação do trabalho via plataformas digitais:a questão da natureza jurídica do vínculo”. Zipperer afirmou que o Brasil ainda tem “uma legislação nebulosa, que não entende as novas relações de trabalho”, e destacou que o trabalho em plataformas digitais abarca diversos tipos de negócios “que não são autônomos nem são subordinados, e por isso não são enxergados pela legislação”, e que há incompatibilidade do trabalho via plataforma com a CLT porque, segundo ele, 80% da CLT não se aplica aos trabalhadores de plataforma.

O painel foi um dos mais comentados, suscitando contribuições de magistrados que acompanhavam as palestras e emitiram outras visões sobre o mesmo assunto, por meio do chat do evento.

Pela manhã, as discussões encerraram com a participação do Prof. Dr. da UFBA e juiz do TRT5, Luciano Martinez, que falou sobre “O direito fundamental à proteção em face da automação:conteúdo e extensão”. O painelista analisou o artigo 7º da CF sob a perspectiva da segurança e saúde ocupacional, que não é observada, e afirmou que “a automação é inexorável, não há como impedir, ela realmente chega”. O magistrado também destacou a participação dos sindicatos para evitar a perda de empregos e a criação de novas oportunidades para os trabalhadores atingidos pela automação.

Na parte da tarde o evento teve continuidade com o segundo Painel, com o tema “Saúde e segurança do trabalhador na contemporaneidade”. O doutor em Política de Ambiente de Trabalho pela University of Massachusetts Lowell, professor e médico, Eduardo Gomes Siqueira, discorreu sobre “Controle remoto: descortinando a lógica dos empregadores da Gig Economy nos EUA”.

Em seguida, o juiz do trabalho do TRT8, doutor em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo e professor da UFPA,  Ney Maranhão, explanou sobre “Capitalismo de plataforma e novos riscos ocupacionais”. O magistrado explicou a nova fase do capitalismo no contexto da hiper conectividade e os riscos psicossociais a que os trabalhadores estão sujeitos ao serem inseridos nessas estruturas digitais de trabalho. “Essa nova fase do sistema fez surgir infraestruturas digitais que permitem que os usuários se conectem. É alimentada por dados, dirigida por algoritmos (inteligência artificial), com poderosos agentes econômicos em uma cadeia de lucro, sem liberdade de negociação”.

O juiz do trabalho da 12ª Região e doutor pela Universidade Federal de Santa Catarina, Rodrigo GoldSchmidt, falou sobre “Direito fundamental à desconexão: conteúdo e alcance”. O magistrado abordou o direito que o trabalhador tem de se desconectar do trabalho, desligar dispositivos digitais, para se dedicar à vida privada e familiar. Na apresentação, o juiz discorreu sobre a legislação que trata do assunto e deu um panorama dos avanços no mundo, com a aprovação de leis recentes sobre a desconexão. Segundo o magistrado, “é necessário impor barreiras técnicas e jurídicas para proteger o trabalhador dessa invasão da vida privada”.

O 3º Painel abordou “Pandemia e relações de trabalho: questões jurídico-contratuais e de responsabilidade civil”. O primeiro painelista foi o Procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais e Pós-Doutor em Direito Societário na Universidade de Coimbra, Nelson Rosenvald, que falou sobre “Pandemia e possíveis impactos na teoria geral da responsabilidade civil”. O tema muito atual teve vários desdobramentos, incluindo os impactos sobre os trabalhadores da área da saúde. A “Obrigatoriedade da vacinação e seus efeitos no contrato de trabalho” foi o tema apresentado pelo Doutor em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa e juiz do trabalho da 15ª Região, Guilherme Guimarães Feliciano. E, finalizando o primeiro dia do Simpósio, o juiz do Trabalho do TRT da 23ª Região e Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, André Araújo Molina, tratou do tema “Covid-19 e responsabilidade civil patronal: pontos polêmicos”, discorrendo sobre os riscos e indenização para trabalhadores da linha de frente da pandemia.

Simpósio

O I Simpósio Internacional da EJUD8 é uma realização da Escola Judicial da 8ª Região e tem apoio do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará (UFPA), Centro Universitário do Estado Pará (CESUPA), Faculdade Pan Amazônica (FAPAN), Faculdade Paraense de Ensino (FAPEN ), Centro Universitário Metropolitano da Amazônia (UNIFAMAZ), Centro Universitário FIBRA, Escola Superior da Amazônia (ESAMAZ) e Laboratório de Inovação, Inteligência e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável do TRT da 8ª Região (LIODS).

O evento disponibilizará certificado aos participantes que assistirem a 70% do simpósio. Quem tem interesse nos novos temas do direito do trabalho pode acompanhar o segundo dia de evento nesta sexta-feira, 07 de maio, pelo canal da JT8 no You Tube. A conferência de encerramento será ministrada pelo Prof. Dr. João Leal Amado, da Universidade de Coimbra, com o tema “Presente e Futuro do Direito do Trabalho”.

Redação: ASCOM/TRT8